segunda-feira, 2 de março de 2009

Portugal na Feira da Cruz Vermelha de Bangkok



A última Feira da Cruz Vermelha, inaugurada em Banguecoque no passado sábado, mais que um evento de natureza social e caritativa, constituiu oportunidade única para os diplomatas exibirem e promoverem a imagem dos países que representam. Coube à nossa embaixatriz, Maria da Piedade Faria e Maya, a honra de pronunciar o discurso de abertura numa cerimónia de grande estadão que contou com a representação da Casa Real na pessoa da Princesa Real Maha Chakri Sirindhorn - depois do Rei a figura mais popular e querida dos tailandeses - e de largas centenas de convidados do corpo diplomático, instituições governamentais, fundações, câmaras do comércio, adidos e imprensa.
Confesso que me surpreendeu o ar de grande supermercado e o aguilhão de fazer dinheiro sem olhar a meios que a quase totalidade dos pavilhões apresentava: de salpicões a chouriços, detergentes e desentupidores de canalizações, de cremes anti-escaldão e pastas de dentes a vinhos e má qualidade, tudo estava impregnado do espírito de peixaria e 7-11 (lojas de conveniência aqui abertas 24 horas por dia) que não poupava representações diplomáticas cuja natureza requer outros cuidados. Fiquei absolutamente consternado ante um enormíssimo stand da Santa Sé que faria as delícias de um qualquer pregador calvinista: calções, cuecas, sardinhas, vinhos e vinagres, queijos, chocolates, latas de conservas e perfumes. O mesmo espírito de vende-tudo nas Franças, Espanhas, Bélgicas, Rússias e Chinas. O mais sórdido capitalismo vende-tudo e fazer dinheiro com tudo exprimia, afinal, o sinal destes tempos em que se inverteram todas as categorias outrora respeitadas pelos Estados. Hoje, a palavra de ordem é negociar, "rentabilizar"e "fazer negócio"; em suma, os Estados transformados em vendedores ambulantes. A plutocracia no seu melhor !



Três excepções naquele mar de vulgaridade: o stand do Butão, promovendo a imagem de um orgulhoso reino budista, enclave de tradição, protecção ambiental, vida serena e frugal ancorada numa forte determinação em manter a diferença; o stand do Japão, promovendo os arranjos florais nipónicos, verdadeiras peças de filigrana saídas das mãos de fina sensibilidade e o stand de Portugal, com produtos de alta gama do melhor que produzimos: vinhos de reserva, azeites, cristais e porcelanas e alguma doçaria tradicional.
Estive presente e reparei que a Princesa Real se deteve longamente ante tais produtos, gabando-lhes a beleza, fazendo elogios à qualidade e até surpreendendo-se pelo facto de termos, nos Açores, uma das mais belas reservas marítimas do mundo, com as grandes baleias que demandam protecção. Depois, a prenda oferecida pela nossa embaixada - em baixela dourada, como exige o protocolo - foi recebido com enorme sorriso de agradecimento. Foi um dia importante. Portugal não seguiu a onda que vai conspurcando o mundo, apresentou-se como é ou como devia ser: a de uma nação antiga, quase milenária, que é uma nação de cultura e não de bufarinheiros. Os portugueses que se habituem a viver com parcimónia, mas com honra e com o sentido da sua excepcionalidade na história mundial. Antes assim que transformados em vendedores de feira. Os siameses, que sabem o que é respeitar a História, compreenderam-no.